quinta-feira, 11 de novembro de 2010

BENÇA.

Confesso que estava ansioso para ver o mais novo espetáculo do Bando de Teatro Olodum, antes intitulado Respeito aos Mais Velhos e transformado em Bença, cumprimento que os mais jovens – pelo menos aqui na Bahia, não sei em outros lugares – dão (ou davam...) aos mais velhos em sinal de respeito à sua experiência. Confesso também que adoro o segundo nome do espetáculo, em uma só palavra resumir todo o contexto da velhice, sua sabedoria própria e tudo que a envolve. E é com imenso pesar que confesso a minha tristeza ao sair do Teatro Vila Velha neste Sábado (06/11/2010) quando finalmente fui ver Bença e presenciei um espetáculo que posso resumir em uma palavra: chato!
Não sou critico de teatro, disso todo mundo sabe, mas falo do lugar de público, que paga pra ver o espetáculo, que sai de casa e faz uma seleção nos cadernos culturais antes para decidir o que vai assistir, o que vai presenciar. Ou seja, eu sou público e como publico não me senti tocado pela peça. Era já para ter publicado minha visão sobre Bença, mas minhas dúvidas eram tão grandes que fui deixando pra lá, pra lá e só agora me sinto a vontade de falar sobre o assunto.
Tecnicamente o espetáculo é perfeito. Surpreenderia-me se o Bando de Teatro Olodum fizesse algo de sem qualidade. Os figurinos um primor, todos de branco, o cenário uma quase instalação, transcendia em muitos momentos o contexto de cenário que simplesmente está ali para “desenhar” a proposta da peça, a trilha perfeita de Jarbas Bittencourt, tudo muito bom e de muito bom gosto.
Um caso a parte é a tecnologia usada no espetáculo. O que eram aqueles telões espalhados pelo palco? Realmente nunca vi algo tão bonito no teatro baiano. Não sai da minha cabeça – e eu nem quero que saia – a imagem de Makota Valdina com o Black branco mais lindo do mundo, ela imponente, linda, olhando vagamente e divagando com toda sua sabedoria. Me arrepiei várias vezes com suas palavras.
Mas o que tinha tudo para dar certo no palco fica confuso. Fica claro a proposta do grupo e também de sua produção que não vai ser contada uma historinha de contexto aristotélico ali no palco do Teatro Vila Velha. O Bando de Teatro Olodum muitas vezes quebrou esta forma de se contar historias. Estão ali fragmentos, cenas tiradas do cotidiano dos mais velhos, frases soltas, depoimentos de figuras importantes da tradição afro baiana, muita música, muito movimento, além de cenas diferentes passadas ao mesmo tempo para a platéia escolher a sua vontade o que vai dar atenção. Tudo misturado.
E isso muitas vezes – quase sempre pra falar a verdade – fica confuso. E velhice pode ser tudo, menos confusão. Bença se entrega ao mostrar a tecnologia, a beleza e se esquece dos seus personagens principais, os mais velhos. Eles estão ali no texto, nos telões, mas ao mesmo tempo não estão. Os depoimentos de Makota são de uma profundidade incrível e é revoltante como a peça consegue transformar tudo o que ela fala em mais um elemento de cena e não em O elemento. Fora os outros depoentes, a toda hora cortados, dizendo frases de efeito que se perdem, criando eco e não se fixam em lugar algum. Era para ser um achado: misturar a rapidez da tecnologia, mil informações por minuto, com a sabedoria gigante vagarosa dos mais velhos. Não dá certo no palco.
Os atores mais velhos do Bando se entregam melhor aos papéis. Dão mais verdade ao que dizem. E ficam lindos! Outra coisa, no dia que fui ver, os atores pareciam que estavam cansados, fazendo a peça pela 15º vez. Bença é movimento constante e muitas vezes tudo parecia tão desconexo.
No meio disso tudo, tirei meus olhos do palco, dos telões e inventei de colocar minha atenção na platéia. Encontrei gente dormindo, jogada nas cadeiras, olhando para o relógio. E comecei a ficar triste. Era o atestado que não era só eu insatisfeito com tudo aquilo. Quando tudo acabou, perguntei ao senhor do meu lado, se ele tinha gostado. Eu realmente pensei (sem ironia alguma!) que não tinha alcançado o tom do espetáculo, pois tenho 26 anos e ele com seus cabelos brancos e sua pele enrugada compreenderia mais o tempo, as questões do espetáculo melhor que eu. O senhor gostou? Perguntei eu meio sem jeito... Meu filho, algumas coisas... Falou ele olhando para o chão. Eu gostei do cenário, mas tem coisas que não gostei. Disse ele com um sorriso sem graça. Lá fora ouvi coisas do tipo “Eu esperava mais” do publico que saia do teatro.
Claro que estou postando aqui os comentários que ouvi. Também os que concordam com minha opinião. Mas teve gente que gostou. Realmente. Eu saí decepcionado. Principalmente por que no dia anterior assisti a um espetáculo tão singelo, mas divertido, há tempos não voltava para casa com um sorriso no rosto ao ver teatro. Dias de Folia é muito legal e vale à pena. Já este Bença, visto no dia seguinte, me decepcionou. Esperava ver a velhice retratada no máximo de possibilidades que o palco do Teatro Vila Velha permitia. Sua sabedoria, a rabugice, o orgulho de envelhecer e em alguns casos a vergonha de estar envelhecendo, o carinho, as divagações, o trato com os remédios e com as doenças próprias da idade, o desrespeito dos mais novos, a sensação que o fim está mais próximo, a alegria de ainda estar desfrutando da vida, o mau humor, o bom humor típico da idade, a nostalgia, as brincadeiras. Esperava ver o que vejo em minhas tias, meus pais, meu avô... Minto se disser que não vi isto tudo em Bença, mas estava tudo tão superficial, envolto em uma camada de tecnologia muitas vezes desnecessária, que não deixava os mais velhos falarem.
O que me pareceu no fim das contas: Bença é um espetáculo que o novo dá lugar para o mais velho falar. Só que os mais velhos não precisam da juventude... Quando os mais velhos falam o silencio é (e deve ser) absoluto, pois a sua experiência, a sua graça faz com que o corpo jovem se adapte ao seu contexto de tão poderoso que é. Não o contrário!

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