segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Cumbe, por Marcelo D'Salete

Na livraria, uma revista em quadrinhos me chama atenção. Estava com Persépolis na mão, decido a ir embora com somente a HQ de Marjane Satrapi, até que vi, em cima de uma pilha de outras quadrinhos, uma revista amarelada com nome Cumbe em destaque. Fiquei em dúvida se comprava. Não pela qualidade do desenho, abri e achei muito bom, mas sim pelo tema e como a história seria tratada principalmente. Procurei pelo autor, referencias básicas e fui na biografia usada para pesquisa da temática da história. Um alívio: ele não usou nem Gilberto Freyre nem João José Reis. Sorri “aliviado”. Ok. vou comprar. Comprei!
Cumbe, de Marcelo D’Salete, conta basicamente a história de negros escravizados que lutam pela liberdade. Sem o clichê dos abolicionistas brancos bonzinhos, nem os senhores bem feitores. Aliás, em Cumbe, assim como no filme 12 Anos de Escravidão, não existe lugar para brancos bons no período colonial! A faceta não muito explorada atualmente no Brasil aqui é colocada com ferocidade. Quem está em primeiro plano são os negros que lutam de todas as formas pela liberdade, nem que ela venha através da morte.
Cumbe é dramática, forte, (muito) violenta e estilosa!  A HQ chama atenção em vários sentidos. Primeiro pela carga dramática de seus desenhos, da forma como enquadra as imagens, de repetir o mesmo quadro para ressaltar pontos diferentes. Na mesma figura perspectivas opostas sobre a situação, ou os sentimentos dos personagens. A forma como a pesquisa histórica é jogada em forma de roteiro é aprimoradíssima. O silencio também é uma característica forte da obra, realçando o suspense, a tensão das invasões, as reações na calada da noite, os segredos, tudo feito e ressaltado com um traço forte, que arrisca e acerta.
Todo em preto e branco, o traço de Marcelo nunca se perde, preenchendo momentos chave da trama com uma dessas cores quase que total à página. Lindo de ver. Além disso, o material da HQ é bastante aprimorado. São 175 páginas distribuídas em um papel de excelente qualidade, com direito a glossário e índice de referencias no final da história. O projeto da HQ foi feito com apoio do Governo do Estado de São Paulo através da Secretaria da Cultura e do Proac 2013.

Devorei o conteúdo em um dia. De quadrinho em quadrinho ia ficando tenso e curioso ao mesmo tempo. Cumbe merece destaque tanto por divertir como informar sobre o tema escravidão no Brasil de forma diferente. Personagens negros protagonistas, não só da trama, como da história e também no sentido de sua personificação... um personagem sujeito, não apenas objeto...

O autor, desenhista Marcelo D'Salete


A minha edição rsrs

Páginas abertas revelam o traço forte