domingo, 8 de abril de 2012

Nas Redes do Sexo - Os Bastidores do pornô Brasileiro - Maria Elvira Díaz-Bertinez.


Nas Redes do Sexo – Os bastidores do pornô brasileiro: (Zahar, 239 páginas. 2010) é o tipo de livro para ler e reler. Simples assim. Aos interessados pelo assunto, encontrarão um livro que acima de tudo respeita o pornô, aqueles que nunca se interessaram pelo mundo dos filmes pornográficos terão um ótimo passatempo. Na verdade, já conhecia o trabalho da autora, María Elvira Díaz-Benítez, por conta da sua tese de doutorado Nas Redes do Sexo – Os bastidores e cenários do pornô brasileiro, para Universidade do Rio de Janeiro. Um ano depois seu trabalho de conclusão virou este ótimo livro sobre uma arte (sim, pornô para mim É arte!) e muitos mitos, verdades cruéis e realidade muitas vezes próximas a nós.
O ponto fundamental para que a obra de Benítez funcione é o respeito ao pornô. Como arte, como produto cinematográfico, como mercado que movimenta milhões. Ela caminha sempre para um não julgamento (e quando cai na armadilha logo abre isso para o leitor). Como antropóloga quer observar, claro que como historiador tenho minhas ressalvas a antropologia, mas é um trabalho tão primoroso que nem tem como não baixar a guarda para este livro.
Benitez fez um bom trabalho de edição de sua tese para o livro que é exposto nas livrarias e entrega tudo. Observa produções héteros, gays e travestis. E abre logo nossos olhos; o cinema pornô brasileiro é completamente diferente do norte americano e europeu. Os corpos são diferentes, a forma de filmar também, os gostos são distintos, as praticas também, os cachês então nem se falam... Homens e mulheres recebem de forma oposta, levando em consideração tempo de carreira (que não passa de míseros anos...), praticas sexuais, respeito às regras (sim o pornô tem regras) as redes de relações do, sem camisinha ou com preservativo etc...
Depois desse aviso prévio a autora nos expõe os sujeitos e suas historias. Diretores, atores, maquiadores, iluminadores, produtores, caça talentos, historias de vida, cruzamento (ou não) da profissão de ator com a de garoto ou garota de programa, moradias, entradas das celebridades no pornô nacional, gente que se tornou celebridade por conta do pornô, gente que fracassou, professores, empresários, grandes estudiosos que hoje trabalham com pornografia (por gosto), a visão da família (que apoia em alguns casos e destrata outros), os casamentos, namoros, a vida das travestis, o que é belo e o que não é e o mais curioso: mesmo uma rede considerada transgressora existem regras de conduta e moralidade muito bem ponderadas pelos profissionais que trabalham nela. Afinal de contas, não é apenas simples e prazerosa putaria, é trabalho, que paga as contas de muita gente, é produto criticado por clientes muito exigentes e mercado de exportação com muito dinheiro em jogo.
O livro é dividido em quatro partes: Preliminares, Transa, Consumação e Elenco. A primeira como o próprio nome diz fala sobre a fase antes da transa (penetração), mas a autora usa o termo como alegoria para falar sobre recrutamento de elenco, visão os diretores sobre seu produto, o porque das pessoas entrarem no pornô e os rituais pré filmagens. Ponto alto do capitulo: a noção (super exagerada) sobre limpeza em todos os aspectos.
A autora
Depois, o livro entra de cabeça na transa. O estágio da ação em si. Há encenação no pornô? Até onde a encenação existe? Elas gozam, elas gostam? Até onde é trabalho e prazer? Sexo sem camisinha ou com? Existe comportamento de risco no mundo dos filmes pornô? A terceira parte comenta a consumação da coreografia pornográfica, dos femininos, o filme na integra que tem de ser cortado, a pós-produção e a distribuição do filme no território nacional e estrangeiro.
No final, a autora nos abre a porta para a vida do elenco. Tocantes historias. Não esperem gente se fazendo de coitadinhas, oprimidas, mas homens e mulheres fortes, decididos e acima de tudo inteligentes. Claro, existem suas contradições, mas acima de tudo são gente como a gente! Sabem que no pornô são somente corpo, sabem que tudo o que sentem e o dinheiro que entra é passageiro. Beleza e performance no pornô são fundamentais.
Nas Redes do Sexo – Os bastidores do pornô brasileiro é um ótimo livro, barato até (R$ 50,00 é o preço médio), muito bem escrito, verdadeiro, chocante, engraçado, pois falar de sexo por conta da nossa moralidade muitas vezes atinge um humor involuntário. Toca em assuntos “proibidos” como feminismo, racismo, homofobia, pois achamos que na cama muitos problemas sociais acabam se resolvendo, ledo engano... Benítez constrói um cenário precioso com muito respeito, no You Tube existem vídeos dela ao lado de gente como Rita Cadilac – uma de suas colaboradoras no trabalho. Ela e colombiana, portanto aviso que quando destrambelha a falar rápido fica complicado (rsrs)... Mas o seu livro é lindo! Propago a todos como um dos melhores que li. Um trabalho para todos que se interessam pelo pornô como arte transgressora e seus resquícios no mundo da psicologia, economia, historia, comunicação...

quinta-feira, 5 de abril de 2012

PULANDO A VASSOURA

Começo dizendo: esse Pulando a Vassoura é o tipo de filme "tanto fez como tanto faz". Se assistir serão duas horas gratas de bom entretenimento, se não... hum... não vai perder muita coisa. O filme não é ruim, longe disso, mas também não é ótimo, nem muito bom. As comédias romanticas dentro do cinema negro nunca surpreenderam muito. Poucas vezes supreendem, as do cinema sem segmento já não são lá grande coisa, imagine as de dentro do gueto!... O cinema negro ainda não reparou que existem singularidades nos romances entre negros, e também com outras comunidades, diferentes dos dilemas e alegrias do dito cinema sem cor... Acho que somente o cinema gay consegue enfatizar esta característica de forma concreta, em alguns casos é claro.
Mas mesmo este "tanto fez como tanto faz" consegue render bons momentos. O elenco coadjuvante é um bom motivo para ver o filme. Sempre bom rever Loretta Devine na ativa, seja no drama ou na comédia essa mulher bota pra quebrar, fora Angela Basset maravilhosa como sempre. Os protagonistas são bons também, mas sem duvida Paula Patton engole Laz Alonso em tudo quando é cena. Além dos outros personagens pequenos, mas desenvolvidos pelo roteiro (enxuto demais!) com competencia.
A história é o que menos interessa e por isso foi renegada ao terceiro parágrafo dessa "crítica". Familia pobre e familia rica tem seus filhos noivos e por conta das diferenças de classe - também ideologicas a respeito da negritude e suas tradições - vao se degladiar até o final bonitinho resolvido as pressas, para abarcar todo tipo de conflito. Estou estragando a supreza? Não! Toda comédia romantica TEM que acabar bem. Doce Novembro não é para qualquer um...
Do mais, fiquem ligados nos extras que comentam a história do "pular vasouras" em casamentos negros norte americanos. Como os negros escravizados não podiam trocar alianças, pois seus casamentos não eram efetivados pelo governo, eles inventaram uma forma de "oficializar" o matrimonio. Por isso pegavam a vassoura e pulavam. Essa tradicão é ligada a escravidão e por isso muitos negros hoje consideram ultrapassado e desnecessario este ritual. Além da luta de classes acontece também a intriga pelas formas diferentes de se ver uma tradição de um mesmo povo. Destaque para a cena da mesa, ensaio de casamento, muito boa por sinal.
Do mais, é um filme mediano. Facilmente esquecivel. Aquele filme do tipo "Como é mesmo o nome dele?"... Mas se arriscar não vai se arrepender, dará boas risadas e durante uma hora e quarenta de filme irá se divertir. Depois relaxe e coma pizza...

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Por Uma Leve Negritude...


Me bateu a vontade de ler um livro dias atrás, estava sem dinheiro para comprar o que realmente queria ler... Resolvi pegar um livro da minha estante e ler novamente. Sempre temos leituras diferentes do mesmo livro. Estão ali, parados em um mesmo lugar, mas sempre em uma releitura eles nos entregam algo diferente. As percepções da obra são distintas à medida que envelhecemos. Estou eu consultando os livros e acho um sobre cotas para negros nas universidades, outro uma biografia de militante negra, outro sobre negros nas novelas brasileiras... Procurava sem achar o que realmente precisava naquele momento... Um livro sobre nosso povo, que não falasse necessariamente sobre o que não somos, os que não alcançamos, onde nós não estamos... Precisava de algo leve naquele momento, semana cheia, cansado, queria descansar com um sorriso no rosto. Na minha estante NADA! Comecei a pensar em outros pontos de cultura, filmes, revistas, peças teatrais... Quando são misturadas a negritude geralmente tem um aspecto extremamente pesado, dramático, triste... Imediatamente veio a pergunta: Por que a negritude é um tema tão pesado, ela não poderia ser simplesmente leve?...
Às vezes penso que não! Fomos marcados – todos nós que nos consideramos negros e os que não se consideram também – pelo racismo, gerações e mais gerações. E este fator, não é nem de longe algo leve a ser encarado. Somente nós sabemos o quão pesado são as agruras racistas, sendo elas pequenas ou violentas abertamente. Seja lá como for, somente nós sentimos a ferida doer... E essa dor repercute em nossa cultura. Música, teatro, filmes, livros muitos deles explicitam nossas dores, ou quando não um heroísmo contra toda a dor que nos abala. Sofremos um martírio imbatível ou somos heróis indestrutíveis. Sempre as manchas, as feridas são a pauta do dia em nossa cultura?
Nossos livros ressaltam muitas vezes o que não somos, onde não chegamos ainda, patamares que não conseguimos alcançar, mas será que no meio disso não há vitórias? Vitoria de sujeito normal, não de um guerreiro negro. Aliás, essa máxima que alia na figura da mulher negra ao patamar de guerreira sempre me dá nos nervos. Esse adjetivo dá a impressão que são mulheres batalhadoras que não caem nunca, não erram jamais... Elas nunca se atrasam para buscar o filho no colégio? Não choram? Ela não sentem desejo por outro homem, por outra mulher, por mais de um homem? Ela é feminista sempre? Não há contradições nesta mulher? A guerreira pra mim não existe.
E esse sofrimento, ou a exigência de ser perfeito me angustia. Precisamos sorrir. Estava reparando que os espetáculos teatrais em Salvador com temática negra tem muito grito, muito sofrimento, muita referencia a época da escravidão, muito perfeccionismo travestido de guerrilha... Precisou um espetáculo do Rio de Janeiro chegar em território baiano para voltar para casa com um sorriso no rosto, refletindo, mas satisfeito e leve. Sete Ventos de Débora Almeida, tinha humor, leve. Conseguia até rir de minhas próprias agruras. Levando-as ao ridículo, consegui supera-las.
Nessa busca incansável por um sorriso negro dentro dos universos compostos na minha estante, acabei encontrando um livro... Parem de Falar Mal da Rotina de Elisa Lucinda. Ótimo livro. Estou lendo novamente. Mistura de teatro, auto ajuda, poesia e muito mais. Recomendo. E sorri dentro de poucas páginas. Estou em um momento onde já sei que mesmo com as cotas as instituições de ensino ainda continuam eurocêntricas, que os brancos sabem que são brancos, mas se dizem não racistas, não brancos, o escambal. Que eu por não ter a tez muito escura para alguns não sou considerado negro e sim moreno, moreninho bla bla bla... Já sei disso e muito mais. Mas agradeço a Deus pelas vitórias alcançadas, junto as minhas contradições e busco algo leve de vez em quando, pois a vida é dura, mas ela não precisa ser SEMPRE dura. E as vezes sozinho no meu quarto, quero ler algo do meu povo, me fazendo lembrar de um orgulho simples e feliz.
Pois felicidade não rima com negritude, mas combina! Acreditem nisso. Quando minha família se reúne, todos de alguma forma são/foram marcados com os signos do racismo, mas a leveza domina o ambiente. A gente ri, conta casos, se sensibiliza, ri novamente, brinca, chora de rir... Eu realmente queria enxergar essa leveza de ser negro presente na minha cultura. Observar um quadro, pintura de menina com cabelos trançados sorrindo radiante, ouvir música ressaltando minha pele feliz... Sei que existem, mas eu quero mais. Há informação sobre o racismo que nos atinge, mas e argumentos para nos tornarmos mais felizes não existem aos montes. Trabalhar para esse tipo de objetivo – a felicidade – também é um compromisso do artista negro, na minha opinião. Pois sorrir é bom demais.