terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Livros ruins que você não pode deixar de ler...

E quem disse que a gente não precisa daquilo que é ruim dentro da casa da gente? Apesar de serem considerados o que há de mais podre dentro da literatura sobre cultura/identidade negra no Brasil - por, é claro, gente que tem real importancia dentro deste mundo... - estes livros são considerados clássicos dentro da academia tradicionalmente eurocentrica. Como todo e qualquer estudante universitário atuante dentro dos projetos dos movimentos negros brasileiros, eu os execrava, mas aprendi que para criticá-los teria de saborear seu "maravilhoso" conteúdo na íntegra e não fruto de leituras de livros de alguém que leu e destrincha o clássico todinho para você. Ler a fonte é sempre importante. E neles estão a síntese do pensamento branco brasileiro sobre a negritude.


CASA GRANDE & SENZALA

Clássico citado por dez entre dez liberais, estudantes sobre escravidão no Brasil e também período colonial. Virou os estudos academicos sobre Brasil colônia de cabeça para baixo por valorizar o que tanto Nina Rodrigues condenava: a miscigenação. De forma original (para a época), Gilberto Freire relata o dia a dia dos escravizados e os senhores de engenho. Dos índios, dos negros, do branco, que acabaram se misturando para o bem da nação... Através dele, Freyre destaca a importância da Casa Grande na formação socio cultural brasileira bem como a da senzala que complementaria a primeira. Freyre dá muita importância ao fatores ambientais e culturais na formação da identidade misturada (vitamina de banana!!!) brasileira. É bem escrito, Gilberto sabe muito bem construir uma leitura leve por cima de um assunto tão enfadonho. Mas em certos momentos parece mais filme de Sandra Bullock, água com açúcar demais para você acreditar que é verdade. Apesar de não ter inventado o termo, o autor e seu livro foram os que inauguraram as verdades sobre "democracia racial" no Brasil. Esse discurso que todos se misturam, que nossa gente na cama se resolve, é bem dele e de seus seguidores...

A CIDADE DAS MULHERES.

Outro divisor de águas da antropologia brasileira, A cidade das mulheres é um estudo sobre o Candomblé  na Bahia do final da década de 1930. Nele, Ruth Landes, além de abordar o riquíssimo universo do candomblé, discute temas até então tabus: o papel de liderança ocupado pelas mulheres e a presença marcante do homossexual masculino nos rituais. Neste livro, vemos muito bem a essencia do brasilianismo. Gringa vem parar aqui para estudar religião de matriz africana e muitas vezes perde tempo em sua escrita a descrever aquilo que considera mágico, estupefato, pitoresco... Salvador parece mais uma terra de loucos  em seus relatos.

OS AFRICANOS NO BRASIL.

Tenta abarcar um monte de vertentes sobre os "descendentes de escravos" no Brasil. Ler Nina Rodrigues, mesmo sabendo que seus conceitos são considerados ultrapassados, é um exercício a paciência. Seus ensaios desbravam vários elementos, entre eles os biológicos, os médicos, os penais, mas sobretudo, os elementos sociais e culturais das populações negras no Brasil. Nina inferioriza o negro, mas abriu o debate sobre negritude em um Brasil que fazia esforço para esquecer que este povo um dia por aqui viveu. Não tem nada de heróico, apesar de reconhecer certos aspectos culturais, Nina acaba reforçando no final das contas o pensamento branco vigente na época em que sua obra foi publicada.

NÃO SOMOS RACISTAS.

Clássico moderno desde que foi publicado. Nasceu da luta Global contra o sistema de cotas para negros em universidades públicas brasileiras. Poderia ser considerado uma besteria sem limites, mas foi escrito por nada mais nada menos que o chefe do departamento de jornalismo da Globo, o que não é pouca coisa neste nosso país. Lendo este livro, dá muito bem para entender o pensamento contra sistemas de ações afirmativas. É vendido como livro que nasce do espanto!!! Diz que as cotas na verdade dividem o Brasil em duas cores, alimentando então uma contra miscigenação e suas incríveis nuances a lá Brasil guaranil... É um livro que até hoje é referência junto aos argumentos contra as cotas raciais. Neo freyriano quase assumido, Kamel se espanta a cada parágrafo e diz que o sistema de cotas poderá gerar um conflito racial... Mãe Dina é fraca!...

O CANDOMBLÉ DA BAHIA.

Vai ter gente que com certeza acha que este livro não deveria estar na lista. Na verdade, esta obra pioneira do frances Roges Bastide, é uma faca de dois gumes. De um lado divulgou o Candomblé e quebrou o silêncio sobre as religiões de matriz africana no Brasil. Essa divulgação trouxe mais pesquisadores, um certo reconhecimento e seriedade às práticas do povo de santo, além que Bastide investiga a crença de forma autônoma, segundo ele mesmo. Por outro lado, divulgar muita gente divulga... E Bastide coloca na mesa segredos que poderiam não ser contados, mas como ele é muito mais que um pesquisador, é um homem de dentro da religião, pode muito bem abrir o que sabe para quem bem quiser e entender... Também é impreciso naquilo que afirma, sua obra tem abordagem marxista, dentre outras críticas feitas a este livro também "clássico".

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei do artigo/post. Precisamos de mais pessoas escrevendo e rescrevendo nossa história. Abraços.