sexta-feira, 29 de outubro de 2010

E MINHAS REFERENCIAS BRANCAS... ONDE FICAM?...

PS BEM GRANDE EM NEGRITO E MAIÚSCULO: O TEXTO A SEGUIR PODE TE FERIR, SIGA POR SUA CONTA E RISCO, OK? O BLOG É MEU E ESCREVO O QUE EU QUERO!...

Em um mundo obviamente eurocentrado, repleto de pessoas brancas lançando seus produtos culturais a todo momento, não é de se estranhar que a cultura branca, de origem européia, estadunidense e até de outros lugares – até porque não existe somente brancos nestes dois lugares – não encontre grandes obstáculos para ser divulgada em tudo quanto é tipo de lugar. Sabemos que a cultura dita universal tem cor, sexualidade, religião, classe muito bem definidas e o que vai de encontro a este ponto é tido como diferente, o micro, e não atinge a todos integralmente.
É curioso perceber que geralmente os personagens brancos não são descritos como brancos. Evidente. Lembro até hoje da experiência de ler Jurassic Park e perceber que o único personagem que era descrito sua cor era um negro. O autor queria deixar “certo” que os outros personagens, menos aquele, eram brancos. Mas era curioso perceber que o autor não descrevia seus outros personagens, parecia que o corpo negro, por ser diferente aquele contexto (o personagem mexia em computadores, controlava todo o sistema de segurança do parque) seria evidenciado da forma certa.
Ou seja, a cultura branca se traduz da forma que mais achar correta e também traduz o Outro da forma como bem quer e entende. E é neste ponto que também não é de se estranhar que haja atualmente uma corrida dos povos “não brancos” (odeio este termo, mas este cai bem neste momento) em busca de si mesmos. É indígena atrás da cultura indígena antes negada, é negro evidenciando que tem orgulho da cor da sua pele e também de suas raízes, dentre outros povos.
E assim, tome-lhe Alice Walker, Alex Hatz, Cidinha da Silva, Spike Lee, Malcolm X, Luther King, Angela Davis, Bell Hooks, Bando de Teatro Olodum, Ângelo Flavio, Margareth Menezes, Lázaro Ramos, Paula Lima, Negra Li, Beyonce, Will Smith, Lee Daniels, Oprah Winfrey, Brenda Fassie, Medhy Custos, Jovelina Perola Negra, Racionais MCS, Xix, Mv Bill, Luiz Miranda, Machado de Assis, TEN, Solano Trindade, Fernanda Julia, Hilton Cobra, Julia Sudbury, Les Desses, Juliana Ribeiro, Vander Lee, Valerie O’rara, Raça Brasil... Ufa! É muita gente e tem outros graças a Deus. O movimento de se descobrir é delicioso e ao mesmo tempo revoltante. Delicioso, pois é incrível você achar algo que tenha haver com você, que você se enxergue, por que sabe muito bem que aquilo que o outro formula não te atinge de forma alguma. Revoltante também, pois a SUA cultura foi negada a você durante um bom tempo e por que só agora aquilo que é mágico e te provoca é mostrado?...
Mas nesta agitação em algum momento você olha para trás e vê... Suas referencias brancas lá atrás... E aí o que você faz? Pára e volta fazendo uma triagem do que pode ser aproveitado nesta nova fase da sua vida, continua seguindo em frente sem olhar para trás, volta atrás de destrói tudo... O que você faz? Vivi esta experiência tempos atrás e resolvi fazer uma triagem. Tem gente que joguei fora mesmo, pois não prestava (Sidney Sheldon nossa, tinha um exemplar dele aqui em casa...), mas tem referencias brancas que tive que faço questão de deixar na minha estante. Afinal de contas o que eu faria com Kid Abelha, Focault, José Arbex, Jorge Nóvoa, Madonna, Elis Regina, James Green, Baz Luhrmann, Almodóvar, Augusto Boal, Irmãos Wachowisk, Anton Tchekhov. O que seriam dos meus momentos fossa (kkkk) sem as canções de Simone? E quando invento de dar uma de roqueiro dos anos 80 e coloco o cd de Roxette aqui em casa? Fora as canções do ABBA, as criticas de Isabela Boscov, a obra de Eric Hobsbawn, os textos de Claudio Simões, Paulo Freire...
Eu vou dar as costas pra este tipo de produto? EU NÃO. Claro que tem uns sujeitinhos racistas que fazem coisas boas até, mas, mas, masss eu procuro nem chegar perto. Acho que não tem problema nenhum ter referencias brancas. Citar este povo, ler, comer com os olhos. Até por que minha negritude não se oferece como uma carência, ela é, existe independente de qualquer forma ou barreira! Ela é plena, não é pedaço. O que não posso é me deixar colonizar por estas referencias, é permitir que o dito universal faça parte de mim e me negue. Não compro, devoro, leio apenas a cultura negra, até por que tem muita gente preta fazendo coisa muito ruim por ai, além de artistas de outras raças que não conheço. Eu quero tragar é o mundo inteiro! E não ele por partes.
Como diz Biko, escrevo o que eu quero e leio, ouço, visto, vejo o que eu bem entender. Não faço parte de modelo algum. Quer dizer que luto contra um modelo vigente há anos para que? Construir outro em cima? Tenha santa paciência! Odeio fazer parte de uma só coisa. Isso pra mim é limitação. Não sou daquele tipo de gente que só freqüenta um tipo de lugar, pois o outro tipo me maltrata, me desfaz como ser humano digno. Ah pelo amor de Deus! Aqui em Salvador, por exemplo, tem mil e um guetos que poderia freqüentar e me sentir super à vontade. Mas além de ir nestes lugares, que acho imprescindíveis para a construção da minha identidade como homem preto, freqüento outros lugares sim. Vou ao shopping freqüentado pela alta sociedade da cidade (ganha um babaloo quem adivinhar a cor desse povo...), vou ao cinema freqüentado pelos “hippes de butique” alternativos, ao museu situado na Orla também alternativo, ao restaurante chic que somente eu e os garçons são negros... São lugares as vezes que vou para além de me divertir me testar. Por que ser negro em um ambiente negro é cômodo e fácil!!!!!! Você está protegido pelo obvio. Agora, seja negro em um ambiente branco, tendo que se defender sozinho, aí meu querido o bicho pega. Se isso te assusta é por que sua negritude não é tão concisa quanto parece... É por que o discurso é maior que a realidade, é por que você cita referencias, mas elas não fazem parte de você, pois não as critica. E isso é extremamente difícil, pois nos foi negado o básico, o auto conhecimento.
É natural que quem não se conhece, em um movimento de olhar para dentro de si, se feche para se conhecer em silencio sem grandes influencias. Mas me fechar, pro mundo inteiro? Não vou, nem quero! Meu processo critico barra tudo aquilo que me impede de ser eu. Termino este post com uma frase de Alice Walker que tornou-se um guia para mim: Não pode ser seu amigo quem exige seu silêncio ou atrapalha seu crescimento.... Vá por mim irmão, faça sua triagem, devore tudo criticamente e siga seu caminho em paz...

2 comentários:

Anônimo disse...

Muito obrigado pelo texto! O que seria dos dias de "fossa" dos dias "eu nao sou paranoico, ta?!" sem o blog? Obgrigado por compartilhar. Ah sim, agora lembro porque o meu he man era tao atraente... rsrsr Paz, irmao!

Santana

marcelo martins disse...

GOSTEI MUITO DO SEU TEXTO,ELE É MUITO EXPLICATIVO E NOS FAZ PENSAR COM FACILIDADE.VALEU MESMO IRMÃO.UBUNTU-EU SOU,PORQUE NÓS SOMOS.