Infelizmente é inevitável
não pensar em CIDADE DE DEUS quando se lê este DESDE QUE O SAMBA É SAMBA do
renomado/concorrido/super cultuado Paulo Lins. Até o caminho da compra do livro,
seu livro antigo que virou filme (um dos maiores sucessos de bilheteria
nacional) faz questão de ser lembrado. Na prateleira da livraria olha Cidade de
Deus pegando no seu pé das mais diferentes formas: edição antiga, edição de luxo
pós sucesso do filme, edição de comemoração de tantos anos de lançamento com
textos adicionais de fulano e beltrano...
Aí voce senta a bunda
no sofá e começa a ler este novo livro de Paulo Lins. Um dos poucos escritores
negros de sucesso aqui no Brasil. Meu objetivo na livraria nem era comprar um
livro dele, mas algum livro falando sobre negritude que não fosse de tema
sofrido. Se quisesse isso (JESUS!) tinha demais – curioso é o numero de
escritores brancos que sabem ver um mundo sombrio dentro da negritude, mas isso
é assunto para outra postagem... – mas um livro com personagem negro,
protagonista, leve, nossa como é difícil conseguir...
Ate que me veio à
cabeça Paulo Lins. E resolvi apostar. O livro dele estava ali, pedindo para ser
comprado. Comprei! Acabei devorando ele em pouco mais de uma semana. Resultado?
Um livro bom! Um protagnista marcante, humano (defeitos e qualidades que fazem
ele se aproximar demais da gente...), um símbolo sexual feminino com certeza
reconhecido daqui a muitos anos e mais uma vez fatos históricos maravilhosamente
arquitetados junto à ficção.
Por que é um livro bom?
Por que o livro começa de forma magistral, mas acaba de forma “qualquer coisa”.
Qualquer coisa mesmo!!! Mas vale a leitura e uma boa leitura. O livro não é
daqueles que te faz ficar ansioso pela próxima folha, ou adiar seu fechamento, já
que te mantém grudado nele... Não. Este te seduz aos poucos, vai revelando o
povo, as ruas do Rio de Janeiro, o samba tomando forma, o politicamente
incorreto do mundo dos cafetões, a putaria das prostitutas que gostam do
perigo, a putaria do povo politicamente correto que diz não fazer, mas não consegue
viver sem uma boa sacanagem e a homossexualidade de alguns personagens (históricos
ou não), tudo aos pedacinhos. Em um mundo que até a literatura atual mais se
parece com textos de um blog curto, fazer escrever literatura que nãos e parece
com roteiro de cinema é um desafio.
Desde Que o Samba é Samba fala sobre justamente o mundo do ritimo que transformou o Rio de Janeiro. O samba carioca e seu lugar e personagens de nascimento. Gente famosa e inventada, tudo junto e misturado. Vemos um Brasil, pós abolição, com mudanças históricas revolucionárias. É neste Brasil, mais precisamente no mundo das putas e cafetões, que o samba vai encontrar achego. Também o livro dá lugar merecido ao povo de santo (Ubanda e Candomblé), que em seus centros e terreiros este ritimo cresceu e viveu por muitos anos. Neste cenário Lins dá vida ao triângulo amoroso Brancura, Vladirene e Sodré.
Brancura é um protagonista
marcante. Negro, alto, forte, terno muitas vezes impecável, politicamente
incorreto, safado, puto, sem vergonha, trabalhador, humano, macho alfa, doido
por uma confusão, desafiador dos fundamentos de Exu... Eis um personagem negro
incrivelmente RICO! Em todos os sentidos. Só lendo para entender seu
desenvolvimento, sua tentativa de sair do mundo da zona e suas justificativas
quando descobre que aquele mundo é seu de verdade. Fora que Lins acabou
escrevendo uma lenda!
Já Valdirene é um símbolo
sexual de proporções gigantescas. Além disso, é uma mulher guerreira, força
inigualável, safada como toda mulher puta tem que ser. Sua garra lembrou muito
Rita Baiana de O Cortiço. Mas ela é ela rsrs! Escrita como uma mulher que
consegue amarrar qualquer tipo de homem. Ela consegue fazer com que um personagem
largue as surubas masculinas para ficar no aconchego de sua vagina! Isso é que
é mulher! Outra personagem politicamente incorreta no texto de Lins.
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O escritor Paulo Lins |
Aliás,
negros e brancos, putas e beatas, cafetões e funcionários públicos, sambistas e
cantores burgueses, ninguém presta realmente neste enredo. O “não presta”
significa descarado, que na primeira oportunidade da rasteira em ótario. Os únicos
dentro da trama que tem algum respeito é o povo de Santo e olhe lá... Por falar
neles, gostei da forma como Lins da voz aos Exus, caboclos, pomba giras e deixam os Orixás “quietos” nesta trama. Eles
fazem a comunicação direta com o humano, são eles que chegam e falam com as
pessoas, dão conselhos e guarda a vida.
A homossexualidade está
presente e é um capitulo a parte. O personagem Sodré, um descendente de
portugueses, um idiota de quinta categoria, que tem um relacionamento pífio com
a família, não quer saber de trabalho, vagabundo nato, é um caso a parte. Ele começa
a tomar jeito de gente logo quando começa a... comer e dar o cu adoiado pro
vizinho e fumar maconha!!!!! Acho que foi o mais louco desenvolvimento de
personagem que vi na minha vida. Só neste aspecto da para ver que Desde que o
Samba é Samba não é um livro qualquer...
E o vai e vem no tempo
que Lins sabe fazer tão bem está aqui neste exemplar também. Então espere por uma historia com inicio meio e
fim bonitinhos, mas como outros inícios meios e fins pelo livro, tudo muito bem
explicadinho e gostoso de ler. No final, Desde Que o Samba é Samba é um bom
livro, nada de obra prima, pois no final o livro parece que foi apressado, tipo
o editor botando pressão por conta do prazo no final de processo e por conta
disso, o autor se meteu a escrever qualquer coisa. É uma visão de um leitor que
esperava mais de uma trama tão gostosa de ler.